Alguém aí conhece Fernando Pessoa?

Não há um de nós que não tenha pelo menos uma poesia ou um trechinho guardado na memória e o recite de vez em quando. Estou errado? Claro que não. Busque aí em sua mente e você encontrará uma, nem que seja Batatinha quando nasce... Pois bem, dentre os poetas de todas as línguas, um dos que mais me fascinam é o Fernando Pessoa. Acredito que para muitos seja o maior poeta da língua portuguesa. Não busco méritos para saber quem é o maior ou o melhor. As palavras cabem e tocam em cada um de nós de formas variadas e em momentos específicos. Mas, voltando ao assunto, o Fernando Pessoa sempre foi mesmo um dos mais apreciados por este que vos escreve.

No início desta coisa chamada Internet – aqui cabe um parêntese: eu lido com comunicação via computador desde os tempos do BBS (Boulletin Board System). O quê? Nunca ouviu falar nisso? Digamos que seja um e-mail do tempo dos bites e bytes lascados. Tão logo abriram a Internet para o povão, eu me aventurei por outros locais e países em busca de conhecimento e coisas que não encontrava por aqui. Sendo assim, acabei parando num canal de IRC (Internet Relay Chat) em Portugal. Ora, eu queria ter informações e comprar cds e/ou lps com os poemas do Fernando Pessoa. Imaginei que seria bacana ouvi-los com a entonação original.

Entrei na sala e deu-se o acontecido abaixo::

- Boa noite, amigos de Portugal.
Passaram-se longos minutos, que imagino tenham sido uns dez e ninguém respondeu. Não me dei por vencido, pois eu não perderia esta oportunidade quase única de conversar com outras pessoas, do outro lado do Atlântico e que falam a mesma língua. Bem, mesma língua em termos, pois segundo o Bernard Shaw, os EUA e a Inglaterra são dois países irmãos separados pela mesma língua e, na minha humilde opinião, o mesmo se dá entre o Brasil e Portugal.

Fiz uma nova pergunta:
- Amigos de Portugal, vocês poderiam indicar cds ou lps contendo gravações dos poemas do Fernando Pessoa?

Novamente longos minutos se passaram e ninguém respondeu. Como nos canais de IRC você poderia identificar a origem de quem lá estava, eu puxei a lista de participantes da sala. Deveria haver umas vinte pessoas, sendo que 18 eram “.pt”, um “.cv” (Cabo Verde) e eu, o único “.br”.

Resolvi, então, tira-los do que parecia um estado de empáfia profunda, pois conversavam entre si e não davam atenção para aqueles dois idiotas – eu e o caboverdiano -, que resolveram se intrometer no canal de IRC do garboso Império Português, e mandei a seguinte pergunta:

- Alguém aí conhece Fernando Pessoa?
Recebi respostas das mais variadas e iradas, sendo que a mais branda foi:

- Mais um brazuca de potes de merda a nos perturbar!

Então, seguiu-se o diálogo:

- Ora, este não deveria ser o linguajar de um povo que exportou sua cultura pelo mundo.

- Falamos como queremos e a língua é nossa!

- Nananinanão! A verdadeira língua portuguesa é a que ficou aqui desde o século XVI, tanto que vocês não conseguem nem ao menos renova-la e importam termos nossos, tudo bem que por conta das novelas como, por exemplo, a palavra gostosa, que aí nem existe.

- Ó pá! As coisas aqui são saborosas e vocês estão a deturpar a nossa língua. E tem mais, vocês das ex-colônias só vem pra cá para criar confusão, hoje somos da Comunidade Européia...

- Novamente está equivocado, amigo. A Europa só começa dos Pirineus em diante.

- Quem você pensa que é?

- Sou fruto do que vocês fizeram aqui desde 1500, e bem melhorado. Portanto, mais respeito com quem é originário das tais ex-colônias.

Neste ponto, eu não sei se falei de mais ou de menos e eles abrandaram os ataques, até o ponto que pareciam ter jogado a toalha. Disseram terem se sentido ofendidos, como se, por acaso, eles fizessem a mesma pergunta numa sala de IRC do Brasil, querendo saber se alguém conhecia um tal de Jorge Amado. Me segurei para não dar continuidade ao embate, pois estava muito mais interessado nas informações sobre as obras do poeta, motivo da confusão. Acabaram por me passar o nome de algumas lojas de discos, nas quais eu poderia fazer as encomendas que desejasse.

Anos depois, eu descobri um lp que a Gradiente gravou, talvez como brinde para seus clientes e fornecedores, contendo os poemas do livro Mensagem, num trabalho primoroso do músico André Luís Oliveira, que musicou os poemas e Caetano Veloso, Elba Ramalho, Gilberto Gil, Zé Ramalho, Elizete Cardoso e outros mais gravaram os gravaram.

Como eu falei lá em cima, a poesia pode tocar a alma de cada um de nós de uma forma e eu mexi com os brios patrióticos dos gajos.


Agora, O Infante, na voz de Elba Ramalho. Espero que gostem.