"Uma daquelas moças estava toda tinta, de baixo acima, daquela tintura, a qual, na verdade, era tão bem feita e tão redonda, e sua vergonha, que ela não tinha, tão graciosa, que a muitas mulheres de nossa terra, vendo-lhes tais feições, faria vergonha, por não terem a sua como ela".
Trecho da carta de Pero Vaz de Caminha ao rei D. Manoel I
Sim, todos somos passíveis de cometer erros durante o transcurso de nossas vidas. Entretanto, causa-me surpresa ver que uma colunista da Folha de São Paulo, a senhora Bárbara Gancia, venha enumerar como vergonhas do Pan o fato de haver vaias para atletas em esportes individuais, o valor das obras do Pan e a performance de nossos atletas como se fossem erros cabais ou vergonhas inomináveis, que comprometeriam a vida dos brasileiros.
Antes de qualquer coisa e sem qualquer pensamento bairrista, visto ser sabido que o carioca é cosmopolita, não apenas por questões históricas mas também por questão de índole social, imagino que, de acordo com o pensamento desta senhora, o Pan deveria ser realizado em qualquer outro lugar que não o Brasil e, mais precisamente, o Rio de Janeiro; e ainda usando a expressão “cometidos no Rio de Janeiro”. Que coisa mais bairrista...
Em seu artigo no caderno de esportes sobre o Pan, de ontem, sábado, dia 28 de julho de 2007, esta senhora cita a matéria de um jornalista italiano que se mostrou indignado, com a possível falta de educação dos torcedores que vaiaram atletas ao disputarem provas individuais. Ora, se é assim, a vaia só vale em esporte coletivo? E, quando, no suposto país desenvolvido e peninsular da Europa, as torcidas dos clubes de futebol exortam o racismo, sendo seus alvos preferenciais os atletas negros oriundos de países africanos ou latino-americanos, esta senhora e o jornalista italiano se calam ou dizem que a Itália é uma vergonha? Ou será necessário citar o exemplo das vaias que a torcida, em Wembley, aplicava no momento da execução do hino do país visitante antes de iniciar uma partida de futebol? Também se calam?
Fico impressionado como pessoas que tem um pouquinho mais de intelecto reproduzem o discurso dominante. O mesmo jornalista italiano, que teve parte de sua matéria garbosamente citada por esta senhora, também pergunta sobre e a cordialidade do brasileiro. Meu Deus! Eles ainda vêem o Brasil como o país do povo dócil e gentil, a nefasta visão neocolonialista. O povo da exótica felicidade. E isto é reproduzido na Folha de São Paulo, como se fosse corroborar algo para alguém com um pouquinho mais de esclarecimento.
Que importa se ganhamos ouro e os outros países não trouxeram seus times principais? Tiveram lá suas razões, mas não se pode desmerecer o esforço de nossos atletas e as medalhas por eles conquistadas. Apenas uma pergunta: Quando um clube de futebol de São Paulo coloca seu segundo time para jogar e perde para uma equipe, que se imagina mais fraca em termos técnicos, quem perdeu? Os jogadores do segundo time ou a instituição clube de futebol? Quem perdeu foi a instituição clube de futebol que leva o nome de Corinthians, Palmeiras, Santos ou São Paulo. É isto que ficará nas estatísticas e na história.
Portanto, quem recebeu prata ou bronze ao perder para um brasileiro ou brasileira, foram o Canadá ou os Estados Unidos.